O Incrível Legado Literário de Tomás Antônio Gonzaga


Escrito por Rebeca Fuks

Tomás Antônio Gonzaga nasceu e foi formado em Portugal. Posteriormente, imigrou para o Brasil e faleceu em Moçambique. Ele foi poeta árcade e advogado.

O texto do autor de Marília de Dirceu e das Cartas Chilenas é uma joia que merece ser observada com atenção. Escrito durante o século XVIII, contém traços autobiográficos e é um reflexo da cultura e dos costumes daquela época.

Sua lírica caracterizada por uma mordacidade, crítica e audácia, contribuiu para torná-lo um dos maiores nomes da poesia neoclássica brasileira.

Grandes Poemas

Em 1792, aos 48 anos, Gonzaga embarcava rumo à África quando publicou sua primeira obra - um volume de poesias intitulado "Liras".

O Arcadismo (ou Neoclassicismo) se tornou a escola literária que sucedeu o Barroco, e abrangeu a obra literária de autor. Esta incluía basicamente duas obras muito distintas.

Tomás Antônio Gonzaga é amplamente reconhecido por ter escrito os versos de Marília de Dirceu e Cartas Chilenas, que são bastante conhecidos pelo grande público.

1792: Marília de Dirceu

A coletânea de Marília e Dirceu possuía originalmente 118 páginas que abrigavam 23 poesias.

Tomás Antônio Gonzaga encontrou Maria Joaquina Dorotéia Seixas (descrita como Marília no poema) ainda na adolescência, quando ela veio para o Brasil no ano seguinte.

Tomás Antônio Gonzaga, seguindo a tradição pastoril, usou a poesia para expressar seu amor por uma jovem que conhecera em Vila Rica. Suas obras foram influenciadas por grandes poetas como Virgílio e Teócrito.

Além de declarar seu amor por Marília, os versos também fazem uma reverência à vida campestre, enquanto criticam a monotonia da cidade.

A linguagem da poesia de Dirceu é simples e fácil de entender. Os versos são sutis e não possuem ritmos complexos. É importante mencionar que Marília, a pessoa adorada por Dirceu, é retratada de forma idealizada na poesia, tanto em seu aspecto físico como em sua personalidade.

Na sua face mimosa,

Marília, estão misturadas

Purpúreas folhas de rosa,

Brancas folhas de jasmim.

Dos rubins mais preciosos

Os seus beiços são formados;

Os seus dentes delicados

São pedaços de marfim.

Marília de Dirceu é uma homenagem à amada, expressa através da poética pastoril de cortejo.

Em 1792, a Tipografia Nunesiana realizou a impressão da primeira edição dos poemas. Sete anos mais tarde, uma nova edição foi impressa pela mesma tipografia, contendo uma segunda parte adicional. Por fim, em 1800, surgiu uma terceira edição que incluía uma terceira parte.

Até 1833, diversas edições de Marília de Dirceu foram publicadas em Portugal. No Brasil, contudo, só em 1802 foi impresso o primeiro exemplar da obra, dez anos depois da primeira edição portuguesa.

Cartas da Chile de 1863

Durante os anos de 1783 a 1788, o governador da capitania de Vila Rica, Luís da Cunha de Menezes, foi alvo de denúncias oriundas das Cartas Chilenas - versos satíricos anônimos - devido à corrupção e aos agrados do seu sistema de governo.

Os versos, assinados por Critilo, não possuíam rima e faziam um deboche à situação da capitania nas treze cartas que foram divulgadas de forma anônima na região.

Devido à intensa repressão e ao medo da censura, as críticas de Critilo tinham que ser disfarçadas. Ele, residente no Chile, supostamente redigiu treze missivas destinadas a Doroteu, seu amigo na Espanha, contando sobre as maldades do desprezível Fanfarrão Minésio, um governador corrupto da colônia espanhola.

Um desconhecido, com a intenção de servir de exemplo para que tal situação não se repita no Brasil, obteve cartas escritas em espanhol e resolveu traduzi-las para o português e espalhá-las por Vila Real.

As maiores críticas nas cartas diziam respeito ao governador de Vila Real, Luís da Cunha de Menezes – às vezes referido como "Fanfarrão Minésio".

Doroteu, presumivelmente Cláudio Manuel da Costa, quem era próximo de Tomás Antônio Gonzaga, era destinatário das cartas. Vila Rica era mencionada como Santiago, e o Brasil, por analogia, seria o Chile.

Com um olhar perspicaz que aponta os erros cometidos pelo governador, as cartas são marcadas por uma ironia sutil.

Critilo frequentemente zomba das supostas fragilidades e restrições de Luís da Cunha de Menezes em seus versos.

Do nosso Fanfarrão? Tu não o viste

Em trajes de casquilho, nessa corte?

E pode, meu amigo, de um peralta

Formar-se, de repente, um homem sério?

Carece, Doroteu, qualquer ministro

– Apertados estudos, mil exames,

E pode ser o chefe onipotente

Quem não sabe escrever uma só regra

Onde, ao menos, se encontre um nome certo?

As Cartas Chilenas possuem inegável valor literário e social, pois retratam de forma clara a vida em sociedade daquela época. Elas mostram como o povo era tratado e como as leis eram (ou não eram) cumpridas pelos governantes da época.

Os versos de Tomás Antônio Gonzaga retratam a capitania mais rica do Brasil na época do final do século XVIII. Eles fornecem um verdadeiro registro do modo como a região funcionava.

Imagem da primeira edição de Cartas Chilenas.

Veja os posts a seguir

Obras Completas

Tomás Antônio Gonzaga não publicou muitas obras, a sua bibliografia é relativamente curta. Estas são:

  • Tratado de Direito Natural, 1768. Marília de Dirceu (partes 1, 2 e 3). Lisboa: Tipografia Nunesiana/Joaquim Tomás de Aquino Bulhões, 2 vols., 1792/1800. Cartas Chilenas. Rio de Janeiro: Laemmert, 1863. Obras Completas (organização de M. Rodrigues Lapa). São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1942.

Vida e História

Tomás Antônio Gonzaga, filho de João Bernardo Gonzaga, um nobre juiz de Montalegre, compartilhava com sua linhagem o interesse pelas leis e pelas letras. Seu avô paterno, Tomé de Souto Gonzaga, era um destacado advogado carioca.

Tomás Antônio Gonzaga teve o seu pai, João Bernardo, matriculado na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra em outubro de 1726. Ele seguia os passos do seu próprio pai, que havia percorrido o mesmo caminho uma geração antes.

Tomásia Isabel Clark, da nacionalidade portuguesa, era dona de casa e faleceu quando o escritor contava apenas com oito meses de vida. Assim, os tios se responsabilizaram por cuidar dele durante os cinco anos subsequentes.

Em agosto de 1744, o último filho do casal Gonzaga, Tomás Antônio, nasceu no Porto. No ano seguinte, a família se mudou para o Brasil e se estabeleceu em Pernambuco, onde João Bernardo foi nomeado ouvidor-geral da capitania. Durante sua estadia no país, o pai de Tomás Antônio também atuou como auditor, corregedor, juiz, provedor de comarca e deputado.

Tomás viveu seus primeiros anos no Brasil, mais especificamente em Pernambuco, e foi posteriormente enviado para cursar seus estudos na Bahia.

Ao completar 17 anos, em 1762, ele e seu irmão José Gomes (com 22) migraram para a Faculdade de Leis de Coimbra. Isto marcava a terceira geração deles fazendo o mesmo caminho. Após concluir o curso em 1768 com o Tratado de Direito Natural, o escritor passou os anos seguintes advogando em Lisboa.

Tomás Antônio Gonzaga assumiu seu primeiro cargo na magistratura aos 34 anos, sendo o cargo de juiz em Beja.

Tomás Antônio Gonzaga

Ao retornar ao Brasil, em 1782, ele foi nomeado ouvidor-geral de Vila Rica (Minas Gerais), que era a capitania mais cobiçada por sua riqueza. Segundo a história informal, ele foi gentil com os devedores mais importantes, enquanto sendo extremamente rigoroso com aqueles sem influência suficiente.

Ele foi condenado por envolvimento na Inconfidência Mineira quando tinha 45 anos e foi preso no Rio de Janeiro por três anos. Em 1º de julho de 1792, foi enviado para a Ilha de Moçambique como degredado.

Tomás teve dois filhos: Luís Antônio Gonzaga, criado pela sua irmã, e Ana e Alexandre, frutos de seu casamento com Juliana de Sousa Mascarenhas, que foi celebrado em Moçambique.

Tomás Antônio Gonzaga, patrono da cadeira número 37 da Academia Brasileira de Letras, faleceu no dia 31 de janeiro de 1807.

A Inconfidência Mineira

Tomás Antônio Gonzaga veio ao Brasil em 1782, e dois anos depois, seu relacionamento com o governador da capitania de Minas Gerais, Luís da Cunha Menezes, deteriorou-se drasticamente.

Durante os próximos dois anos, ele redigiu cartas a D.Maria I, expondo claramente as ações agressivas do governador.

No período em questão, o pagamento de um quinto do ouro extraído era exigido e direcionado à Coroa Portuguesa. O governador, encarregado de averiguar e arrecadar este imposto, usava um modo cuja legalidade era muito contestada.

Devido à crise na produção de ouro, a capitania precisou encontrar outras formas de obter recursos. Para isso, ela proibiu a produção de certos produtos, optando pela importação de mercadorias de outras regiões, cobrando altos impostos sobre elas.

Em 1788, algumas reuniões com o objetivo de secessão chamaram a atenção de diversos cidadãos revoltados com a situação. No ano seguinte, Joaquim Silvério dos Reis denunciou o ocorrido a Portugal, o que resultou na prisão e julgamento dos envolvidos. Tomás Antônio Gonzaga fazia parte desse grupo e supostamente teria participado de pelo menos duas reuniões.

Após ser julgado e condenado, o escritor foi preso e exilado para Moçambique, onde ele seria forçado a permanecer por, pelo menos, dez anos.

Tomás Antônio Gonzaga recomeçou a sua vida em Moçambique, onde casou-se com Juliana de Sousa Mascarenhas e teve dois filhos. Alcançando cargos públicos de destaque, ele eventualmente chegou ao posto de juiz de alfândega.

Rebeca Fuks
Escrito por Rebeca Fuks

É graduada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2010), possui mestrado em Literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2013) e doutorado em Estudos de Cultura pelas Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e Universidade Católica Portuguesa de Lisboa (2018).