Quem nunca desejou, no intenso fervor do amor, mandar uma poesia para manifestar seus sentimentos? Ou, quem sabe, escrevê-la?
Como forma de inspirar os amantes do mundo todo, reunimos neste lugar vários dos melhores poemas de amor de diferentes épocas e localidades.
Florbela Espanca: Uma Ode ao Amor
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui… além…
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!…
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder… pra me encontrar…
O soneto de Florbela Espanca - uma das maiores poetisas portuguesas - trata de amor sob uma ótica incomum. O eu-lírico não revela seu sentimento ao objeto do seu afeto ou promete amor incondicional, mas sim anseia por liberdade.
O sujeito poético deseja experimentar o amor em toda a sua extensão, sem estar restringido a amar apenas uma pessoa.
O poema aborda a noção de finitude humana e o anseio de aproveitar o curto período de existência, para sentir todos os sentimentos com a maior intensidade possível.
Amor Mortal: Uma Obra de Maria Teresa Horta
Morrer de amor
ao pé da tua boca
Desfalecer
à pele
do sorriso
Sufocar
de prazer
com o teu corpo
Trocar tudo por ti
se for preciso
Em algumas linhas curtas, o poema Morrer de amor, de Maria Teresa Horta, publicado em Destino, apresenta a fervorosidade dos amantes.
Com poucas palavras, a obra expressa o desejo dos amantes de estarem juntos, a necessidade de satisfazerem um ao outro e a percepção de que o amor é a prioridade na vida deles, acima de tudo.
Charles Bukowski: Uma Confissão
Esperando pela morte
como um gato
que vai pular
na cama
sinto muita pena de
minha mulher
ela vai ver este
corpo
rijo e
branco
vai sacudi-lo talvez
sacudi-lo de novo:
hank!
e hank não vai responder
não é minha morte que me
preocupa, é minha mulher
deixada sozinha com este monte
de coisa
nenhuma.
no entanto
eu quero que ela
saiba
que dormir todas as noites
a seu lado
e mesmo as
discussões mais banais
eram coisas
realmente esplêndidas
e as palavras
difíceis
que sempre tive medo de
dizer
podem agora ser ditas:
eu te
amo.
Charles Bukowski, poeta norte-americano, era conhecido por sua vida desregrada: um boêmio cujo dia a dia estava repleto de álcool e diversão. Os poemas do autor estavam marcados por essa realidade. Entretanto, eram escassos os poemas dele dedicados ao amor, sendo que "Confissão" fazia parte desta lista.
O título deste poema diz muito sobre o seu tom: uma confissão partilha segredos e medos que frequentemente não nos atrevemos a revelar. Esta partilha é uma espécie de registro íntimo.
O eu-lírico revela o seu temor de deixar a sua amada sozinha. Ele se desmonta e libera todo o afeto que tem por ela, que normalmente era silencioso, no final da sua vida. Ele prevê a aproximação iminente com a morte e, em poucas linhas, transfere todos os seus sentimentos para a sua amada.
Excerto VIII do livro 'Vinte poemas de amor e uma canção desesperada' de Pablo Neruda
Sim não foi porque teus olhos tem cor de lua,
de dia com argila, com trabalho, com fogo,
e prisioneira tens a agilidade do ar,
sim não foi porque és uma semana de âmbar,
sim não foi porque és o momento amarelo
em que o outono sobe pelas trepadeiras
e és algum pão que a lua fragrante
elabora passando sua farina pelo céu,
oh, bem amada, eu não te amaria!
Em teu abraço eu abraço o que existe,
a areia, o tempo a árvore da chuva,
E tudo vive para que eu viva:
sem ir tão longe posso vê-lo todo:
veio em tua vida todo o vivente.
Pablo Neruda, um poeta chileno laureado com um Nobel, é famoso por suas centenas de poemas de amor, que se tornaram clássicos da literatura latino-americana.
No belíssimo e longo Vinte poemas de amor e uma canção desesperada, encontramos uma declaração de amor seguindo os moldes tradicionais. Esses versos exaltam o encanto da mulher amada e prometem uma devoção incondicional.
O eu-lírico usa elementos da natureza - como o céu, a lua, o fogo e o ar - para criar metáforas com o intuito de elogiar aquela que ama.
Amando Alguém às Vezes com Walt Whitman
Às vezes com alguém que amo, me encho de fúria, pelo medo de extravasar amor sem retorno;
Mas agora penso não haver amor sem retorno – o pagamento é certo, de um jeito ou de outro;
(Eu amei certa pessoa ardentemente, e meu amor não teve retorno;
No entanto, disso escrevi estas canções.)
Walt Whitman, considerado o pai da poesia moderna, criou algumas obras poéticas dedicadas ao amor romântico, como "Às vezes com alguém que amo".
Muitos de nós já sentimos o medo de amar com demasiado e não sermos retribuídos. Um sujeito poético, em apenas quatro versos longos e livres, pode transmitir essa mesma sensação. Esta aflição é tão comum, mas muitas vezes difícil de exprimir.
Ao final do poema, a mensagem é que, mesmo que não sejamos amados de volta, isso nos dá a capacidade de criar obras poéticas maravilhosas.
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William Shakespeare's Sonnet 116
De almas sinceras a união sincera
Nada há que impeça: amor não é amor
Se quando encontra obstáculos se altera,
Ou se vacila ao mínimo temor.
Amor é um marco eterno, dominante,
Que encara a tempestade com bravura;
É astro que norteia a vela errante,
Cujo valor se ignora, lá na altura.
Amor não teme o tempo, muito embora
Seu alfange não poupe a mocidade;
Amor não se transforma de hora em hora,
Antes se afirma para a eternidade.
Se isso é falso, e que é falso alguém provou,
Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.
O Soneto 116 fala de amor como um sentimento idealizado. Através da visão de Shakespeare, o amor é algo capaz de transpor qualquer limite, enfrentar qualquer desafio, ultrapassar o tempo e qualquer outra dificuldade.
Sem Você, de Alberto Caeiro
Quando eu não te tinha
Amava a Natureza como um monge calmo a Cristo.
Agora amo a Natureza
Como um monge calmo à Virgem Maria,
Religiosamente, a meu modo, como dantes,
Mas de outra maneira mais comovida e próxima …
Vejo melhor os rios quando vou contigo
Pelos campos até à beira dos rios;
Sentado a teu lado reparando nas nuvens
Reparo nelas melhor —
Tu não me tiraste a Natureza …
Tu mudaste a Natureza …
Trouxeste-me a Natureza para o pé de mim,
Por tu existires vejo-a melhor, mas a mesma,
Por tu me amares, amo-a do mesmo modo, mas mais,
Por tu me escolheres para te ter e te amar,
Os meus olhos fitaram-na mais demoradamente
Sobre todas as cousas.
Não me arrependo do que fui outrora
Porque ainda o sou.
Só me arrependo de outrora te não ter amado.
Normalmente, o heterônimo Alberto Caeiro de Fernando Pessoa produzia versos que retratavam a vida calma e pacífica no campo, bem como a harmonia com a natureza.
Eu me arrependo de não ter escolhido viver o amor antes, quando ainda não tinha encontrado você. Esta é uma expressão de amor romântico, onde podemos sentir a intensidade dos sentimentos do eu-lírico.
O sentimento da paixão mudou a maneira como o sujeito poético viu a natureza. Esta experiência foi tão única que a amada foi responsável por esta revolução de visualização. O amor vivido a dois permitiu que o poeta sentisse a vida de forma diferente.
Hilda Hilst - Ama-me
Aos amantes é lícito a voz desvanecida.
Quando acordares, um só murmúrio sobre o teu ouvido:
Ama-me. Alguém dentro de mim dirá: não é tempo, senhora,
Recolhe tuas papoulas, teus narcisos. Não vês
Que sobre o muro dos mortos a garganta do mundo
Ronda escurecida?
Não é tempo, senhora. Ave, moinho e vento
Num vórtice de sombra. Podes cantar de amor
Quando tudo anoitece? Antes lamenta
Essa teia de seda que a garganta tece.
Ama-me. Desvaneço e suplico. Aos amantes é lícito
Vertigens e pedidos. E é tão grande a minha fome
Tão intenso meu canto, tão flamante meu preclaro tecido
Que o mundo inteiro, amor, há de cantar comigo.
A brasileira Hilda Hilst compôs uma abundância de poemas de amor, todos de indiscutível qualidade poética. Em suas obras, há versos que dão voz aos sentimentos mais profundos de entrega, um tom mais lânguido e apaixonado.
O poema "Ama-me" destaca a lírica poderosa de desejo e paixão. A figura poética deseja se entregar para sentir toda intensidade de sentimentos, contudo, deseja também se proteger e preservar o corpo e a alma da força do desejo.
Finalmente, nos últimos versos, parece que a tendência para a aventura ultrapassou as inseguranças.
Os Olhos de Octavio Paz
Teus olhos são a pátria do relâmpago e da lágrima,
silêncio que fala,
tempestades sem vento, mar sem ondas,
pássaros presos, douradas feras adormecidas,
topázios ímpios como a verdade,
outono numa clareira de bosque onde a luz canta no ombro
duma árvore e são pássaros todas as folhas,
praia que a manhã encontra constelada de olhos,
cesta de frutos de fogo,
mentira que alimenta,
espelhos deste mundo, portas do além,
pulsação tranquila do mar ao meio-dia,
universo que estremece,
paisagem solitária.
O escritor mexicano Octavio Paz foi agraciado com o prêmio Nobel de Literatura. Ele explorou inúmeros gêneros literários, entre eles a poesia de estilo romântico.
No poema Teus olhos, o eu-lírico faz uma série de comparações encantadoras da mulher amada com elementos da natureza, como o relâmpago, as ondas, as árvores e os pássaros. Estas belas palavras são escritas em versos livres.
Soneto da Doce Queixa de Federico García Lorca
Assusta-me perder a maravilha
de teus olhos de estátua e o acento
que pela noite a face me polvilha
a erma rosa que há no teu alento.
Tenho pena de ser sobre esta orilha
tronco sem ramos, e a dor que sustento
é não ter eu a flor, polpa ou argila
pró verme de meu próprio sofrimento
se és meu tesouro oculto, que sitio,
se és minha cruz e meu sofrer molhado
e eu o cão preso de teu senhorio,
não me deixes perder o que me é dado:
vem decorar as águas do teu rio
com folhas de meu outono perturbado
Federico Garcia Lorca, originário da Espanha, nos presenteou com um poema lindo, repleto de emoção e dedicação.
Lorca se utiliza de uma forma clássica - o soneto - para expressar um olhar original: enquanto o eu-lírico louva a beleza da amada, ele também teme seu desaparecimento.
Por um lado, é privilégio ter uma amada tão bela; por outro, é pesadelo imaginar como seria a vida sem ela. O registro aqui se reveza entre essas duas perspectivas.
Soneto na Estilo de Camões por Sophia de Mello Breyner Andresen
Esperança e desespero de alimento
Me servem neste dia em que te espero
E já não sei se quero ou se não quero
Tão longe de razões é meu tormento.
Mas como usar amor de entendimento?
Daquilo que te peço desespero
Ainda que mo dês - pois o que eu quero
Ninguém o dá senão por um momento.
Mas como és belo, amor, de não durares,
De ser tão breve e fundo o teu engano,
E de eu te possuir sem tu te dares.
Amor perfeito dado a um ser humano:
Também morre o florir de mil pomares
E se quebram as ondas no oceano.
A poeta portuguesa Sophia de Mello Breyner Andresen escreveu várias poesias repletas de paixão, e entre elas destaca-se o Soneto à maneira de Camões, uma obra especialmente dedicada ao amor.
Inspirado pelo mestre da literatura portuguesa, o poema foi escrito como um soneto. Falando sobre as contradições do amor, ele desperta esperança mas também causa desespero.
O amante se encontra em um estado de perplexidade, tendo que escolher entre desejar ou não desejar, entre a lógica e a desolação, entre a curta vida e a imortalidade. Ele é simultâneo entre a perdição e o encanto.
Uma Manhã em que a Ternura é Reina: um Conto de José Luís Peixoto
um dia, quando a ternura for a única regra da manhã,
acordarei entre os teus braços. a tua pele será talvez demasiado bela.
e a luz compreenderá a impossível compreensão do amor.
um dia, quando a chuva secar na memória, quando o inverno for
tão distante, quando o frio responder devagar com a voz arrastada
de um velho, estarei contigo e cantarão pássaros no parapeito da
nossa janela. sim, cantarão pássaros, haverá flores, mas nada disso
será culpa minha, porque eu acordarei nos teus braços e não direi
nem uma palavra, nem o princípio de uma palavra, para não estragar
a perfeição da felicidade.
Incluído na obra A Criança em Ruínas, do escritor português contemporâneo José Luís Peixoto, encontra-se o poema acima.
O eu-lírico imagina um futuro ideal, onde ele poderá desfrutar das alegrias simples da vida ao lado da amada. Composto em versos livres e longos, o poema expressa seus desejos com muita emoção.
No poema, dois seres se reconciliam, abraçando a ideia de deixar o passado para trás e celebrando um futuro de alegria. Os versos são expressões de esperança, que celebram a descoberta de um novo começo, recheado de felicidade e harmonia.
Encontro-te em Cada Rua - Mário Cesariny
Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
Mário Cesariny, poeta português, nos convida, através dos versos de Pena Capital, a ver o mundo através dos olhos do amante-eu-lírico. Esta pessoa é completamente apaixonada pela sua amada, que ocupa todo o seu coração e pensamento.
Aqui, lemos um processo de idealização da mulher amada, que assume uma existência na mente do sujeito poético, tornando-o capaz de a ver mesmo quando ela não está presente diante de seus olhos.
O poema registra a presença daquela que é louvada, mas o signo mais forte é o da ausência.