Entendendo a Trajetória de Joan Miró Através de 10 Principais Obras Surrealistas


Escrito por Sónia Cunha

Joan Miró (1893-1983), um dos mais influentes surrealistas e abstratos, foi um artista plástico espanhol de destaque.

No dia 20 de abril de 1893, Miró nasceu em Barcelona, filho de um famoso ourives, em uma casa abastada. Porém, ao optar pelo caminho das artes e não pelos negócios, desapontou sua família.

Ao longo de toda sua vida, Juan Miró desafiou os padrões da arte tradicionalmente figurativa e procurou por novas formas.

1. Enric Cristòfol Ricart: Retrato de 1917

Retrato de E.C.Ricart

No Retrato de Enric Cristòfol Ricart, pintado em Barcelona no início da carreira de Miró, já é possível ver alguns traços característicos que o acompanharão através das suas décadas de produção artística.

O personagem principal é representado de uma forma atípica ao usar pijamas. O fundo foi criado com uma combinação inesperada de cores e estampas. O artista demonstrou grande habilidade ao reunir estilos tão diferentes em um só quadro.

"Eu me senti atraído ao cubismo e ao expressionismo". Miró expressou sua atração ao cubismo e ao expressionismo durante essa fase de sua carreira artística.

Como eu lhe disse, de 1916 a 1920, fui apaixonado por Van Gogh, Rousseau e Picasso - admirações que sinto até hoje no mais alto grau.

2. A Fazenda nos Anos de 1921-1922

A fazenda (1922)

Em 1910, com a intenção de proporcionar uma boa situação financeira para Miró, seus pais conseguiram um emprego para ele como auxiliar de contabilidade. Porém, devido ao desânimo que sentiu, ele contraiu tifo. Em 1912, para recuperar sua saúde, a família o mandou para a área rural de Mont-Roig - uma propriedade que eles possuíam.

Miró decidiu-se inteiramente às artes ao pintar uma série de quadros e se matricular na academia de arte de Francesc d’Assís Galí. Porém, em 1915, optou por se tornar autodidata e deixou a escola.

Em 1921, Pablo Picasso retornou à região de Mont-Roig e terminou a versão final de sua tela nessa mesma localidade. O quadro capta a esencia da Espanha, trazendo a tona características que são emblemáticas da paisagem e dos costumes locais.

O pintor principiante calculou a pintura complexa e repleta de detalhes ao pormenor, que levou nove meses para ser concluída. Sua tela, profundamente planejada, foi criada em três regiões diferentes que ele viveu: Mont-Roig, Barcelona e Paris (no ateliê na rua Blomet).

3. A Caçada na Paisagem Catalã (1923-1924)

Paisagem catalã (1924)

Em 1923, Joan Miró começou a trabalhar em uma de suas pinturas mais conhecidas, Paisagem catalã, o caçador.

Metade da tela é pintada de amarelo e a outra metade de vermelho, sem uma separação exata. Alguns elementos aparecem em desordem. O título "O Caçador" parece ter relação com a figura na parte inferior, que se parece com um animal com bigodes e cauda triangular com a língua estendida para capturar um inseto.

No canto inferior direito, é possível ver a abreviatura SARD, que se refere à Sardana, um estilo de música folclórica muito popular na Catalunha.

Em 1924, o manifesto surrealista de André Breton deu voz aos artistas, dentre eles Miró, um dos mais ilustres membros. O escritor afirmou:

A tumultuada entrada de Miró em 1924 marca um passo importante no desenvolvimento da arte surrealista

4. O Corpo da Minha Morena

Le corps de ma brune... (1925)

O corpo da minha loura... é uma das raras obras em que o pintor faz uso da palavra escrita na tela.

Miró, espanhol, optou por escrever seu texto em francês devido à influência do surrealismo, movimento parisiense com o qual se identificava.

O quadro é uma expressão de amor por parte do artista plástico para sua amada. Um fato interessante é que as pinturas do ano de 1925 têm o mesmo fundo marrom e destacam-se pontos azuis e vermelhos. Esta obra revela o lado poético do artista.

5. Celebração do Carnaval do Arlequim em 1925

Carnaval do Arlequim (1925)

Carnaval do Arlequim é uma obra celebrada de Miró. Ela exibe um tema alegre, repleto de elementos e cores fortes, que simbolizam a abstinência da tradição do carnaval.

No lado direito, uma pequena janela simples foi inserida no ambiente cotidiano do quarto. O cenário simples da janela, parede sóbria e chão é iluminado pelo festival de símbolos e cores mágicas do carnaval.

A obra apresenta diversos elementos surrealistas, como ilustrações que o pintor criou a partir de sua própria mente, agora que ele se juntou ao movimento surrealista.

6. A Origem do Mundo (1925)”

Nascimento do Mundo (1925)

Em 1925, na fazenda da família, em Mont-Roig, Joan Miró criou uma tela caracterizada por um fundo sombrio, esfumaçado, em tons escuros de preto e marrom. Após sua recente exposição em Paris, onde foi elogiado por seus colegas surrealistas, o pintor vivia um bom momento.

Miró partiu para um estilo de representação totalmente diverso dos que pintara antes nas paisagens da fazenda e produziu obras com elementos cada vez mais abstratos. Nelas, vemos fundos com muitas manchas, respingos, cascatas, explosões, tinta escorrida, no tom sombrio.

Referências presentes em Nascimento do Mundo sinalizam para os sonhos, as alucinações e os delírios, tal qual o intuito do surrealismo. O destaque vai para os elementos coloridos que pontuam o quadro, como o balão vermelho que segura a corda amarela.

Ao longo dos séculos, muitos pintores já abordaram o tema do nascimento do mundo. No entanto, Miró conseguiu desenvolver uma visão única sobre o que considerou ser o começo da sua própria existência. Sua obra oferece numerosas interpretações, dentre elas a de uma criança que solta um balão e brinca de pipa.

7. Lançamento de uma Pedra por um Personagem em Direção a um Pássaro (1926)

Personagem Atirando uma Pedra num Pássaro, 1926

A obra-prima Personagem Atirando uma Pedra num Pássaro, criada com tinta guache, foi criada durante a juventude de Miró, enquanto ele estava recluso na Mont-Roig.

Durante esse período, as obras foram realizadas de forma mais simples e com linhas mais singelas, tornando o trabalho mais sintético, usando poucos componentes.

Na tela, vemos uma paisagem muito simples, com elementos fundamentais destinados ao entendimento do público. A linha do horizonte, que separa o céu da terra, é um deles. A figura da perna com olho parece saída de um sonho e tem uma característica motivação surrealista.

A atmosfera divertida de uma brincadeira aparece claramente na obra desse artista, tanto nos quadros quanto nessa única peça.

8. Holandeses Internos: 1928

interior holandês (1928)

Inspirado em uma obra clássica do século XVII de Hendrick Martensz Sorgh, o colorido quadro Interior holandês possui uma série de elementos únicos. A pintura retrata o interior de uma casa.

"A origem desta pintura está no cartão-postal que eu comprei no Rijksmuseum". Durante uma visita ao reconhecido Rijksmuseum em Amsterdã, Miró teve a oportunidade de comprar um cartão-postal que retratava uma obra presente no museu. Esta imagem serviu de inspiração para seu trabalho Interior holandês. O próprio artista relatou: "A base desta pintura é um cartão-postal que eu comprei no Rijksmuseum".

Tinha o cartão-postal preso ao cavalete enquanto pintava.

A produção do artista espanhol se desviou do estilo naturalista do século XVII, optando por imagens mais planas e elementos simbólicos menos representativos. Ele enfatizou o que julgava ser o mais fundamental da pintura de Sorgh, dando prioridade a esses elementos.

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9. Pessoas e Corda: Eu em 1935

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A obra Corda e pessoas, eu, de Miró, destaca-se pela utilização de objetos externos na sua criação. Neste caso, a corda é pregada com ganchos sobre a placa de madeira pintada. Além disso, Miró também criou peças utilizando a colagem.

A tela apresenta apenas quatro cores primárias: azul, branco, vermelho e preto. No centro, a corda compete por espaço no quadro com figuras desconhecidas e deformadas.

A corda foi presa de maneira esticada, imitando a figura de um ser humano, como se ela também fizesse parte das figuras retratadas no quadro.

10. Descobrindo o Misterioso com um Pássaro Belo para um Casal Apaixonado (1941)

O Belo Pássaro Decifrando O Desconhecido A Um Casal De Amantes

O quadro faz parte da série Constelação, que conta com vinte e quatro trabalhos do espanhol Joan Miró. Estes desenhos foram criados durante um período complicado da vida do artista: entre 1936 e 1940, ele vivia na França e enfrentava um crise pessoal, ao mesmo tempo em que o continente se deparava com a Guerra Civil Espanhola e a Segunda Guerra Mundial.

Em meio à tragédia, Miró fugiu para Palma de Maiorca entre 1940 e 1941 onde criou 13 obras-primas da Constelação. Cuidadosamente, ele se dedicou aos trabalhosos desenhos que remetiam a elementos da natureza, tornando-os ricos em detalhes.

Nesta obra, encontramos formas abstratas clássicas da pintura do artista, um espírito que evoca brincadeiras e o universo onírico, porém representado muito mais profundamente na tela.

No dia 25 de dezembro de 1983, Joan Miró partiu deste mundo, falecendo em Palma de Maiorca, na Espanha.

Sónia Cunha
Escrito por Sónia Cunha

É licenciada em História, variante História da Arte, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto (2003) e em Conservação e Restauro pelo Instituto Politécnico de Tomar (2006). Ao longo da carreira profissional, exerceu vários cargos em diferentes áreas, como técnico superior de Conservação e Restauro, assistente a tempo parcial na UPT e professora de História do 3º ciclo e ensino secundário. A arte e as letras sempre foram a sua grande paixão.