A obra "Missa do Galo", de Machado de Assis, foi originalmente publicada em 1893 e incluída, posteriormente, em Páginas Recolhidas (1899). É uma narrativa curta, ambientada em um único lugar, com dois personagens principais; no entanto, é uma das obras mais famosas do autor.
Sinopse da História
À noite, Nogueira relembra uma conversa que teve com Conceição, durante sua estadia em Mangaratiba. Ele tinha dezessete anos quando deixou a cidade para concluir os estudos preparatórios no Rio de Janeiro, e ficou hospedado na casa de Meneses, que havia se casado com uma prima dele. Conceição, por sua vez, era a esposa de Meneses em segundas núpcias. Durante sua estadia, Nogueira se lembra de uma conversa que teve com a mulher mais velha.
Todas as semanas, Meneses ia ao teatro e cometia adultério - algo que todos da casa sabiam: a sogra, Nogueira e até a própria mulher. O narrador decidiu não viajar durante o Natal e ficar no Rio de Janeiro para assistir à missa do galo na Corte. Ele acertou com um vizinho que o acordaria para irem juntos à missa e, enquanto isso, Nogueira ficou esperando e lendo na sala.
Àquela hora tardia, Conceição surgiu na sala e começou a conversar com Meneses. Comentaram sobre vários assuntos, tomando conta do tempo. Porém, o momento foi interrompido pelo vizinho, que bateu na janela para chamar Nogueira a lembrá-lo da missa a qual estava comprometido.
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Explorando o significado do conto
Narrado em primeira pessoa, Nogueira relembra sua breve interação com Conceição, que o deixou com uma impressão indelével, mas também com a incerteza de o que aconteceu entre eles naquela noite.
No início do texto, a narrativa sugere uma conversa enigmática e intrigante entre o contador de dezessete anos e uma senhora de trinta anos.
Agir Agora
A narração é ambientada no passado, revelando acontecimentos que já ocorreram. Embora não se saiba a idade do narrador no momento em que escreve, ele já é adulto e tem consciência das intenções de Conceição naquela noite, embora continue se questionando a respeito.
A sua memória se mostra imprecisa em relação a vários detalhes do episódio, inclusive na data em que ocorreu, sendo que foi mencionado como sendo na véspera de Natal de entre 1861 e 1862.
Ação no Espaço
A cena se passa no Rio de Janeiro, onde a Corte estava situada. Tudo acontece dentro da casa de Meneses, especificamente na sala. A descrição aponta para uma casa de estilo burguês, com sofás, poltronas e canapés decorando o ambiente. Dois quadros com figuras femininas enfeitam a sala, sendo uma delas Cleópatra, criando um clima de lascívia que contrasta com a pureza suposta de Conceição.
Conceição expressa seu desejo de ter duas imagens, duas santas, na casa de família. No entanto, ela reconhece que isso não seria socialmente aceitável. Assim, os quadros podem ser vistos como símbolos das forças sociais que reprimem seus desejos.
Casamento e Convenções Sociais em Conceição e Meneses
Quando Nogueira se mudou para o Rio de Janeiro, foi acolhido pelo casal que compartilhava um lar com sua sogra e duas escravas. As antigas tradições eram seguidas de perto, pois às dez horas da noite todos se recolhiam aos seus quartos, e às dez e meia a casa já havia adormecido.
Inspirados por preceitos morais tradicionalmente conservadores, o casal adotava atitudes injustas e contrárias aos direitos das mulheres. Meneses tinha uma amante, com quem se encontrava regularmente, e a esposa era obrigada a aceitar a traição em silêncio, para evitar que o assunto se tornasse público.
Muito pouco é conhecido sobre Meneses, a não ser suas relações com uma mulher divorciada. Conceição, por sua vez, foi deixada sozinha na véspera de Natal pelo marido, que preferiu ficar com a amante. Talvez pela gravidade da data, ou devido ao seu desgaste e raiva com a situação, ela decidiu se aproximar de Nogueira, embora o adultério não tenha se materializado.
Apesar de Conceição e Meneses serem casados, a relação entre eles era fria. Esta vontade de se envolver com outro homem se confirmou quando Meneses morreu de apoplexia e Conceição se casou com o seu escrevente juramentado.
Explorando o Erotismo e o Desejo com Conceição e Nogueira
Quando Conceição entrou na sala, Nogueira estava lendo Dom Quixote e esperando a hora da missa. Ela se sentou diante dele e perguntou: "Você gosta de romances?". A pergunta, que parecia inocente, poderia ter um significado oculto. O assunto da conversa fez essa hipótese parecer cada vez mais forte.
Eles começaram com uma conversa sobre livros, e, em seguida, as discussões foram surgindo de forma despretensiosa. O que realmente importava era aproveitarem aquela oportunidade para manter o vínculo entre eles. O diálogo só era usado como pretexto para que pudessem viver aquele momento de intimidade.
Ela avisava ao narrador para que ele falasse mais baixo, pois há o risco de acordar a mãe. A conversa a aquelas horas da noite e o clima de mistério deixava claro que uma mulher casada não deveria estar conectada com um jovem.
Nogueira, ainda inexperiente e confuso com o que estava ocorrendo, observou que Conceição não conseguia desviar os olhos dele. De vez em quando, ela passava a língua nos lábios, como um gesto que ele não conseguia ignorar.
Pela descrição, notamos que Nogueira estava hipnotizado pela mulher de Meneses, prestando atenção a todos os movimentos que ela fazia. Ele se deliciava com cada detalhe, desde a maneira como ela andava até "o bico das chinelas", uma possível referência a seus seios. Antes, Conceição era considerada "mediana", entretanto, de repente ela tornou-se ainda mais bela e encantadora.
Com os olhos de Nogueira, contemplamos a transformação de Conceição, de santa para mulher atraente, passando a fazê-lo descuidar da igreja e da missa.
O encontro de Nogueira com o narrador foi abruptamente interrompido pelo barulho do vizinho batendo no vidro da janela para convocá-lo para a missa do galo. Na igreja, o narrador não conseguia afastar da sua mente a imagem do encontro: "a figura de Conceição surgiu-lhe vezes sem conta, entre o padre e ele".
No dia seguinte, ela se comportou como se nada tivesse acontecido, sem demonstrar o que havia sido dito na véspera. Ela era "natural, benigna”, como se a conversa não tivesse existido.
A Importância da Missa do Galo na Obra de Machado de Assis e o Naturalismo
No conto, o estilo naturalista fica evidente: há ênfase nas descrições psicológicas em vez das físicas, e exploração profunda da sexualidade e da mente humana, bem como de vontades ocultas e comportamentos desaprovados pela sociedade.
Apesar de o conto lidar com o assunto do adultério (não só de Meneses com sua amante, mas também de Conceição com Nogueira), foi somente um toque no ombro que houve entre eles.
Não obstante, o que é significativo não é o que de fato sucedeu, mas sim, o que poderia ter acontecido. Dessa forma, não foi possível satisfazer o desejo que ambos sentiam um pelo outro.
Com seu estilo único, Machado de Assis contrasta o sagrado e o profano, a vontade e a proibição, o desejo e o compromisso moral com destreza. Esta conversa entre duas pessoas noite adquire, com isso, uma profunda simbologia, tornando-se uma das obras mais renomadas do autor. Por isso, "Missa do Galo" continua sendo uma referência na literatura brasileira.
Personagens Centrais
Nogueira era um jovem introvertido, que dedicava seu tempo à leitura, a poucos relacionamentos e a uma que outra caminhada. É nítida a sua atração pela esposa de Meneses, porém, a falta de experiência o impede de saber como lidar com a proximidade repentina entre os dois.
Nogueira está dividido entre o temor de desrespeitar Conceição e seu desejo por ela. Ele se mostra confuso quanto aos acontecimentos da noite, sem saber exatamente o que ela queria.
Conceição, chamada de "a santa", tinha um temperamento calmo, não dando lugar a euforias ou tristezas. Sabendo das traições de seu marido, ela aproveitou a noite de vigília da missa do galo, quando Meneses estava ausente, para se aproximar de Nogueira, que estava hospedado em sua casa.
Depois de perder o marido, Conceição resolveu se casar novamente. No entanto, o comportamento dela voltou a ser o mesmo de antes, como se o íntimo encontro da noite anterior nunca tivesse existido.
