A Vida de Frida Kahlo - Pintada em Tinta


Escrito por Carolina Marcello

A notável pintora mexicana Frida Kahlo y Calderón (1907— 1954) tornou-se famosa por seus trabalhos coloridos e autorretratos. Seu sucesso internacional contribuiu para divulgar os costumes e cultura do México, alcançando o planeta inteiro.

Com suas pinturas, Frida transmitiu seu espírito guerreiro, sua crítica à realidade e seus ideais para o futuro. Usando a arte como veículo, ela retratou momentos dolorosos de sua vida e expressou seu modo de ver o mundo.

A Vida e Obra de Frida Kahlo

A Infância Inicial

Quadro Meus avós, meus pais e eu.

No dia 6 de julho de 1907, Magdalena Carmen Frida Kahlo y Calderón nasceu em Coyoacán, Cidade do México. Filha de Matilde Gonzalez y Calderón e Guillermo Kahlo, ela pertencia a uma família com ascendência alemã, espanhola e indígena.

Aos seis anos, Frida - a terceira das quatro filhas do casal - teve seu início de problemas de saúde, com uma poliomielite que deixou sequelas em seu pé direito. Dona de uma vida marcada por dores, ela foi criada na Casa Azul - a residência da família, onde passou grande parte de sua vida.

O Desastre e a Obra de Arte

Quadro O Onibus (1929)

Kahlo tinha apenas 18 anos quando sofreu um acidente grave: o ônibus em que viajava colidiu com um trem, causando-lhe numerosos ferimentos e fraturas, que exigiram várias cirurgias e um longo internamento hospitalar.

A garota não tinha um grande interesse pela pintura até a sua fase de convalescença. Foi nessa época que o seu pai montou um cavalete para que ela pudesse pintar enquanto estivesse deitada na cama. Apesar de já frequentar aulas de modelagem e desenho, foi então que ela descobriu uma real paixão pela pintura.

A artista descobriu uma grande paixão que perdurou para o resto de sua vida. Ela dedicou sua arte a produção de autorretratos, destacando seu corpo ferido e enfaixado no colete ortopédico, que precisou usar por muito tempo.

Diego Rivera e o Partido Comunista

Desde a adolescência, Frida manifestou-se como uma mulher progressista, demonstrando grande interesse pelas questões políticas e sociais da época.

Ela costumava garantir que viera ao mundo em 1910, ano em que ocorreu a Revolução Mexicana, e se orgulhava de se considerar "filha da revolução".

Em 1928, a pintora recuperou-se do sinistro acidente e inscreveu-se no Partido Comunista Mexicano. Foi ali que ela se encontrou com Diego Rivera, o homem que mais influenciou a sua vida.

Quadro Frida e Diego

Rivera era 21 anos mais velho do que Frida e era bastante conhecido como pintor e importante figura do Muralismo Mexicano. No ano seguinte, eles decidiram se casar e começar uma jornada juntos cheia de desafios.

As Consequências da Vida Conjugal, Viagens e Traições

A Casa Azul foi o lar do casal e onde a artista sofreu um trágico aborto espontâneo. O episódio foi particularmente desolador para ela, sendo refletido em suas pinturas, como a obra Hospital Henry Ford.

Quadro Hospital Henry Ford (1932)

Após o convite de Diego para expor suas obras internacionalmente, Frida decidiu acompanhá-lo nos Estados Unidos. Lá, passaram a frequentar os círculos culturais e artísticos, o que contribuiu para o aumento da produção de telas da pintora.

A ligação de Kahlo com o México era muito forte e bem próxima às suas tradições e raízes. Ela se inspirava e admirava muito a arte popular do seu país.

Durante os tempos que passou nos Estados Unidos da América, uma conflito interior se desenvolveu, dando a sensação de estar dividida entre dois países.

Autorretrato na fronteira

Após um período, o casal volta ao México e enfrenta problemas conjugais. Em 1937, Frida recebeu em sua Casa Azul Leon Trotsky e sua esposa Natalia Sedova, que haviam buscado refúgio no México. Trotsky, um revolucionário da União Soviética, era perseguido por fascistas e stalinistas.

Relatos sugerem que Frida e Diego, separados por quase 30 anos de idade, compartilharam uma paixão proibida. No entanto, o término desta relação não foi motivado por isso: Frida descobriu o envolvimento de Diego com sua irmã, Cristina Kahlo.

Retrato de Frida Kahlo e Diego Rivera (1939).

"foi uma dor tão grande que não tinha nome". Após iniciarem a sua relação, Frida e seu parceiro tiveram inúmeras discussões, tentaram resolver as suas diferenças diversas vezes, porém, não obtiveram êxito e acabaram se separando. Tal desgosto amoroso deixou Frida tão abatida que ela chegou a escreveu: "foi uma dor tão grande que não tinha nome".

Diego, houve dois grandes acidentes na minha vida: o bonde e você. Você sem dúvida foi o pior deles.

O Êxito Internacional, a Doença e o Fim da Vida

Apesar da confusão reinante, a carreira de Frida Kahlo subiu aos céus. Além de dar aulas na Escola Nacional de Pintura e Escultura, os seus trabalhos de arte foram expostos em grandes galerias, ao lado das obras de artistas reconhecidos. Em 1939, o seu quadro foi exibido pela primeira vez no Museu do Louvre.

Mesmo com seu trabalho em ascenso, a saúde de Frida foi deteriorando. Ela teve problemas nos pés e na coluna, resultando em múltiplas cirurgias e dores contínuas, precisando contar com o apoio de um colete ortopédico.

Quadro A Coluna Quebrada (1940).

Apesar das dificuldades, ela não deixou de pintar até o fim, encarando a arte como uma forma de resistência. Por meio das suas telas, o seu corpo passou a ser representado em vários ângulos.

"Estou lutando para não perder a minha alegria." Em 1953, quando uma de suas pernas foi amputada devido a uma gangrena, a mexicana registrou em seus diários (atualmente publicados) uma frase que dizia: "Estou lutando para não perder a minha alegria".

Pés, pra que os quero, se tenho asas para voar?

Ilustração 'Pes, para que os quero...?'

No ano seguinte, a artista morreu devido a uma embolia pulmonar, mas alguns acreditam que foi resultado de um abuso de medicamentos. Pouco antes de sua partida, ela escreveu uma nota despedindo-se na sua agenda:

Espero que minha partida seja feliz, e espero nunca mais regressar.

Fundamentos das Obras de Frida Kahlo: Temas e Pinturas

A pintura sempre foi algo especial para Frida. Foi uma válvula de escape para a dor e a doença que afligiram a sua vida. Para além disso, a arte foi um meio de expressão e de narrar a sua história.

Apesar de ter sido identificada como surrealista por renomados artistas do movimento, como Dali e Breton, Kahlo não aceitou o título. Pelo contrário, ela defendeu que não estava pintando sonhos, e sim representando sua realidade.

Retratos Autorreflexivos

A pintora Frida Kahlo gostava muito de se retratar. Sua produção artística é composta principalmente por autorretratos que mostram seu crescimento e desenvolvimento ao longo dos anos.

Autorretrato em um vestido de veludo vermelho (1926)

Autorretrato em um Vestido de Veludo Vermelho foi a primeira obra de Frida Kahlo, pintada para homenagear seu grande amor, Alejandro Gómez Arias, um escritor e político mexicano.

Devido à quantidade de tempo que passou a recuperar do acidente ou das operações sozinha, pode-se explicar, ao menos parcialmente, a quantidade de telas que detinha de sua própria pintura.

"Tentei representar o processo de transformação como se estivesse documentando-o". Ela usou as telas para mostrar o processo de transformação, como se o documentasse. Sobre isso, ela afirmou: "Tentei retratar a mudança, como se estivesse registrando-a".

Eu sou minha única musa, o assunto que conheço melhor.

Narrativa de Mulher

Quadro Meu Nascimento (1932).

A obra da pintora destacava-se pela sua audácia em abordar assuntos considerados provocativos e polêmicos para a moral da época.

A pintura de Frida abordava a anatomia e a história da mulher de forma expressiva. Ela retratou cenas de partos e abortos espontâneos com uma simplicidade realista.

A pintora sofreu vários abortos devido à perfuração do seu útero no acidente sofrido na juventude. Esta experiência parece ter gerado um sofrimento associado à maternidade que é refletido em suas telas, evidenciando e internalizando as dores das mulheres.

Quadro Umas Facadinhas de Nada (1935)

Em 1935, a artista Frida Kahlo se pronunciou acerca do machismo extremo e violento da sociedade mexicana. Em Unos Cuantos Piquetitos ou Umas Facadinhas de Nada, ela imortalizou uma história de feminicídio que havia lido nos jornais, sobre um homem que assassinou sua esposa de forma cruel.

Explorando as Tradições e a Beleza da Natureza

Quadro As Duas Fridas (1939).

Frida fazia parte de um mosaico de heranças culturais, que ela misturava e convivia harmoniosamente. Da Europa, adquiriu hábitos e cultura; de sua ascendência mexicana e indígena, herdeiou tradições.

No quadro As Duas Fridas (1939), a pintora expressou a sua dualidade. Por meio das suas telas, manifestou a sua paixão pelo México, com destaque para flores, frutos e diversos animais dos ecossistemas locais.

Quadro Veado ferido (1946)

Às vezes, na obra Veado Ferido, as figuras do animal e da artista parecem se fundir, como se a natureza estivesse servindo como um paralelo ou uma metáfora para seus sentimentos.

A sua conexão com a terra e o meio ambiente expressava ainda um vínculo com a religião e a espiritualidade, fundamentado nas antigas crenças e arquétipos.

Em "O abraço de amor do Universo, a terra (México), Eu, Diego e o senhor Xólotl", Frida Kahlo dá vida ao seu modo de ver o mundo, a natureza, o amor e a própria morte. É nessa obra que a sua visão se torna visível.

Quadro O abraço de amor do Universo, a terra (México), Eu, Diego e o senhor Xólotl (1949).

A Doença do Corpo

A pintura e a dor estiveram sempre presentes na vida da artista Frida. Apesar de ter sofrido com problemas de saúde que demandaram tratamentos, operações e internamentos, ela encontrou na arte uma forma de superar os desafios que enfrentava. Por isso, Frida continuou pintando mesmo diante das adversidades da vida.

Ela pintava a si mesma e o seu mundo, mas também abordava questões ligadas à doença, ao desgaste do corpo e à morte.

A Coluna Quebrada revela a dor física e emocional que o autor sentia, refletida no seu corpo apertado pelo colete ortopédico que precisava utilizar.

Quadro Sem Esperança (1945).

Em 1945, quando Frida já não tinha forças para levantar-se da cama, pintou Sem Esperança. É nesse quadro que podemos ver o seu inseparável cavalete de trabalho. Nele percebemos como a sua arte lhe dava forças para continuar, como se aquilo que a fizesse persistir fosse a criação artística.

No ano seguinte, Frida criou uma obra refletindo sua dor e sofrimento: o seu corpo ferido e deitado, e outra Frida sentada, transmitindo esperança. Apesar dos desafios, ela ainda encontrava forças para reagir e seguir em frente.

Quadro Arvore da Esperança, Mantem-te Firme (1946)

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Citações memoráveis de Frida Kahlo

Eu te amo mais do que a minha própria pele.

Preciso lutar com todas as minhas forças para que as pequenas coisas positivas que minha saúde me permite fazer sejam direcionadas para ajudar a revolução. A única razão real para viver.

Sinto-me mal, e ficarei pior, mas vou aprendendo a estar sozinha e isso já é uma vantagem e um pequeno triunfo.

A Influência de Frida Kahlo na Cultura Moderna

Mural em Berlim com um retrato de Frida Kahlo.

Ao longo das últimas décadas, Frida Kahlo teve sua popularidade aumentada e cultuada por sua imagem imponente, não somente como pintora, mas também como pensadora e visionária. O tempo não apagou, mas aumentou seu brilho.

Sua vida, repleta de histórias emocionantes e inesperadas, ainda desperta interesse do público em todos os cantos do globo.

Ao Cinema

Em 2002, o filme Frida, dirigido por Julie Taymor e estrelado por Salma Hayek, fez sua estréia, contando a história da artista.

Estilo e Tendências da Moda

A criatividade e originalidade de Kahlo a tornaram um ícone da cultura popular. Suas raízes foram lembradas e homenageadas através de várias formas de arte.

A pintora foi uma grande influência na moda: suas roupas coloridas, penteados com tranças e flores no cabelo são homenageadas em todos os cantos do mundo, através de editoriais e desfiles.

Promovendo a Justiça Social

Naquela época ainda tão controlada pelo pensamento patriarcal, Frida lutava por seus ideais, a liberdade e os direitos das mulheres. Ela era independente, desafiadora e apaixonada pela vida. Boêmia, ainda assim, ela não se acovardava diante das lutas políticas e sociais.

Frida Kahlo tornou-se o símbolo da luta feminista. Ela é retratada em cartazes e ilustrações, servindo como inspiração para as mensagens "Somos todas Fridas" e "Mesmo soFrida, jamais me Kahlo".

Frida Kahlo é reconhecida como um símbolo de representatividade: como mexicana, mulher bissexual e portadora de deficiência física. É uma prova de que, apesar das adversidades, ela conseguiu superar os obstáculos da vida e alcançar um alto nível de sucesso.

Em meio às convenções sociais, aos problemas de saúde, à limitação de movimentos e às dificuldades no amor, Frida Kahlo persistiu e teve seu nome registrado na História. É por isso, e muito mais, que se tornou um ícone de habilidade e superação, sendo admirada pelas gerações atuais.

Descobrindo a Vida e Obra de Frida Kahlo

  • O espírito rebelde de Frida Kahlo contrastava completamente com os ideais da época. Embora casada com Diego, a artista era bissexual e mantinha relacionamentos com mulheres, o que era bastante chocante. Além disso, ela era conhecida por seu grande consumo de tequila - possuindo o maior número de shots em uma noite entre seus amigos. Contudo, sua saúde mental sofria abalos e Frida tentou cometer suicídio diversas vezes. Por causa das suas tentativas anteriores e pela nota deixada em seu diário, muitos acreditam que a morte de Frida Kahlo não foi acidental, mas sim, uma escolha consciente.
Carolina Marcello
Escrito por Carolina Marcello

Formou-se em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto e possui mestrado em Estudos Literários, Culturais e Interartes pela mesma instituição. Durante os estudos universitários, foi co-fundadora do Grupo de Estudos Lusófonos da faculdade e uma das editoras da revista da mesma, que se dedica às literaturas de língua portuguesa.