Significado da Expressão "Vou-me embora para Pasárgada"


Escrito por Rebeca Fuks

O poema "Vou-me embora pra Pasárgada", de Manuel Bandeira, foi incluído em seu livro "Libertinagem" (1930). É considerado uma obra modernista de grande relevância.

O sujeito procura um refúgio em Pasárgada, como se fosse um paraíso perdido, para fugir de sua atual realidade.

Ao ouvir pela primeira vez um relato a respeito de Pasárgada, cuja existência foi confirmada como sendo a capital do Primeiro Império Persa, Bandeira, então com 16 anos, se viu fascinado com a ideia de que aquela teria sido uma cidade repleta de encantos. Guardando a imagem na memória, o poeta trabalhava até que, finalmente, conseguisse criar o poema que lhe rendeu fama, no qual faz referência àquela cidade.

Vou-me Embrenhar para Pasárgada: Um Poema na Íntegra

Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconsequente

Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente

Vem a ser contraparente

Da nora que nunca tive

E como farei ginástica

Andarei de bicicleta

Montarei em burro brabo

Subirei no pau-de-sebo

Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado

Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe - d’água.

Pra me contar as histórias

Que no tempo de eu menino

Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro

De impedir a concepção

Tem telefone automático

Tem alcalóide à vontade

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

- Lá sou amigo do rei -

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada.

Explorando o Significado do Poema 'Vou-me embora para Pasárgada'

No poema de Manuel Bandeira, o personagem expressa sua necessidade de escapar para um outro mundo, um lugar diferente da sua realidade presente.

No poema Vou-me embora pra Pasárgada, a ideia de fuga é explorar a possibilidade de aventura, de independência, de diversão sem limites e sem as consequências dos atos.

Pasárgada é visto como um símbolo de liberdade, um lugar onde é possível realizar qualquer sonho.

O tema da fuga foi explorado por muitos escritores, inclusive pelo autor Bandeira. Em especial, durante o período romântico, era comum encontrarmos obras que retratavam um amor não correspondido, e as consequentes reações de escapar para lugares distantes ou de se entregar à ideia da morte para evitar mais sofrimento.

Os escritores arcádicos buscavam inspiração nos campos, nas paisagens desoladas e rurais. Neles, acreditavam que havia uma pureza que poderiam captar em suas criações literárias.

O Sujeito Anuncia sua Mudança na Estrofe 1

No começo das linhas, ele anuncia de forma definitiva que irá deixar seu local de origem e estabelecer-se em Pasárgada.

Ele acredita que ser "amigo do rei" lhe dará poder no lugar da sua imaginação. Essa amizade com alguém poderoso é o seu melhor argumento para conseguir aquilo que deseja.

dinheiro, amor, trabalho e conhecimento. A cidade de Pasárgada oferece a todos a chance de alcançar algo que, talvez, jamais tenham tido a oportunidade de ter: dinheiro, amor, trabalho e conhecimento.

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

O conhecido poema de Manuel Bandeira elogia a cidade de Pasárgada, que foi a capital do Primeiro Império Persa. Ciro II foi o responsável por sua construção. Esta localidade, assim como descrito pelo poema, de fato existiu.

Descobrindo o Motivo da Partida no Verso 2

Depois da leitura do poema, o leitor sentiu um desabafo saindo do sujeito, claramente demonstrando que ele não estava contente com o lugar em que se encontrava.

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconsequente…

Observamos tristeza contrastando com a vida que o indivíduo espera em outro lugar (nesse caso, Pasárgada).

A ideia de explorar um local desconhecido, repleto de aventura e possibilidades inesperadas, é o que atrai nessa terra onde o amigo é rei. Uma mudança que seria a antítese do que se tem na vida real, despertando grande desejo de vivê-la.

Descobrindo o Propósito do Protagonista em Pasárgada na Estrofe 3

Na terceira parte do poema, o sujeito decidiu descrever como seria seu cotidiano na terra distante após anunciar e justificar a mudança.

No lugar de Pasárgada, o poeta aprecia a harmoniosa conexão com a natureza e recorda-se dos dias passados com ternura.

E quando estiver cansado

Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe - d’água.

Pra me contar as histórias

Que no tempo de eu menino

Rosa vinha me contar

Neste trecho é possível notar a reminiscência da infância. O sujeito promete voltar no tempo com a ajuda de duas figuras místicas: a mãe d'água, uma criatura mágica, e a Rosa, cuja identidade é desconhecida, mas que ao que tudo indica teve um papel importante na vida do menino.

Durante a infância, sentindo-se protegido e seguro com a presença das duas mulheres, o sujeito deseja, agora, retomar essa sensação.

Descobrindo os Desejos Mais Profundos na Estrofe 4

Na quarta parte do poema, descobrimos o que fascina aquele que deseja se mudar para Pasárgada: sua intimidade.

Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro

De impedir a concepção

Tem telefone automático

Tem alcalóide à vontade

A análise se fundamenta na comparação entre o que se encontra presente naqui e o que se encontra lá, em Pasárgada.

Aos poucos, o sujeito desperta no leitor a ideia de que Pasárgada é um lugar incrível, onde não há necessidade de se preocupar com métodos anticoncepcionais e é possível viver de forma livre.

A Existência de Tristeza em Pasárgada Revelada na Estrofe 5

Embora Pasárgada possua diversas qualidades positivas, o sujeito admite que, em determinado momento, pode se sentir triste. No entanto, ele sabe que, se isso acontecer, estará no local certo para superar a melancolia rapidamente.

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

- Lá sou amigo do rei -

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada.

Chegando ao fim do poema, ele conclui que, como amigo do rei, pode desfrutar da mulher que tanto anseia e que, só por isso, vale a pena partir para Pasárgada em busca da sua grandiosa aventura.

A Biografia das Criações de Bandeira

Ao longo de sua carreira, Manuel Bandeira costumava infundir suas próprias experiências nos seus trabalhos. Libertinagem, contêiner do poema que será aqui discutido, é uma das obras que evidencia essa inspiração proveniente da vida do poeta.

No poema "Vou-me embora pra Pasárgada", muito dos medos do próprio poeta são observados. Sua vida estava limitada devido aos problemas de saúde adquiridos após uma tuberculose que não foi devidamente tratada.

"O mundo está em constante mudança". A análise realizada por Alfredo Bosi, teórico da literatura brasileira, conclui que o mundo está em constante transformação.

O adolescente mal curado da tuberculose persiste no adulto solitário que olha de longe o carnaval da vida e de tudo faz matéria para os ritmos livres do seu obrigado distanciamento

Em entrevista, Bandeira confessou que a imagem da cidade de Pasárgada habitava os seus pensamentos desde a adolescência, algo que foi refletido na composição de um dos seus poemas mais ilustres.

Após muitos anos, o poeta foi inspirado a compor algo que eternizasse a beleza da Pasárgada, tornando-a um lugar maravilhoso para sempre.

Foi o poema de mais longa gestação em toda a minha obra. Vi pela primeira vez esse nome de Pasárgada quando tinha os meus dezesseis anos e foi num autor grego (...) Esse nome de Pasárgada, que significa “campo dos persas”, suscitou na minha imaginação uma paisagem fabulosa, um país de delícias (...) mais de vinte anos depois, quando eu morava só na minha casa da Rua do Curvelo, num momento de fundo desânimo, da mais aguda sensação de tudo o que eu não tinha feito na minha vida por motivo da doença, saltou-me de súbito do subconsciente esse grito estapafúrdio: “Vou-me embora pra Pasárgada!

Gilberto Gil Musicou 'Vou-me embora para Pasárgada'

O poema de Bandeira foi considerado um clássico da literatura nacional, e foi memorizado com a música de Gilberto Gil e a voz de Olivia Hime, presente no álbum Estrela da vida inteira (1987).

A versão de Gilberto Gil é amplamente conhecida, mas Paulo Diniz já havia adaptado o poema em sua música há mais de dez anos.

Vida e Obra de Manuel Bandeira

Manuel Bandeira

Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho foi criado no Recife no dia 19 de abril de 1886. Era filho de Manuel Carneiro de Souza Bandeira, um engenheiro, e de Francelina Ribeiro, uma mulher de família abastada. Esta família do poeta era composta por influentes políticos, advogados e latifundiários.

Aos 16 anos, Manuel e sua família se mudaram para o Rio de Janeiro. Durante sua faculdade, ele decidiu seguir o curso de Arquitetura e foi aceito na Escola Politécnica de São Paulo, em 1903.

Bandeira ficou doente e desenvolveu uma tuberculose. Devido a isso, foi obrigado a interromper o curso. Como consequência, sua família decidiu enviá-lo para a Suíça para tratamento, já que ele estava muito abatido.

Uma Retrospectiva da Obra Literária de Manuel Bandeira

Em 1917, A cinza das horas foi a primeira obra de Bandeira a ser publicada, sendo influenciada pelos estilos simbolista e parnasiano. Porém, em Carnaval (1919), já podiam ser notados elementos mais afinados com o estilo que o autor seguiria em sua carreira.

Em 1921, o poeta teve o conhecimento de Mário de Andrade e, de forma veloz, começou a trabalhar em conjunto com a revista modernista Klaxon. Participou ativamente do grupo, enviando o poema Os sapos para que fosse lido durante a Semana de Arte Moderna de 1922.

Bandeira foi um grande escritor, tendo produzido poemas, prosas, críticas de cinema e músicas durante toda a sua vida. Em 1940, foi eleito Imortal da Academia Brasileira de Letras, sendo o terceiro a ocupar a Cadeira 24.

Aos 82 anos, no dia 13 de outubro de 1968, o poeta faleceu no Rio de Janeiro, deixando para trás um significativo legado literário.

O modernismo brasileiro teve Manuel Bandeira como um de seus principais nomes

Manuel Bandeira foi um dos destacados expoentes do modernismo brasileiro e participou ativamente da Semana de Arte Moderna, realizada em 1922.

Com Libertinagem (1930), o poeta alcançou uma importante conquista na sua carreira, pois foi nessa obra que ele aderiu totalmente ao modernismo, como mostra o poema Vou-me embora pra Pasárgada.

Essa entrada no novo movimento literário veio para mudar o cenário da época, que estava saturado com a visão parnasiana, caracterizada por versos rígidos e rimas fixas, para algo mais moderno. Com essa nova abordagem, a literatura voltou a ser criada com simplicidade e leveza, com uma linguagem menos elaborada.

Veja os posts a seguir

Rebeca Fuks
Escrito por Rebeca Fuks

É graduada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2010), possui mestrado em Literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2013) e doutorado em Estudos de Cultura pelas Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e Universidade Católica Portuguesa de Lisboa (2018).